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Espírito de Natal

Um certo dia, no mês de Dezembro, uma menina perdeu o espírito de Natal. Este tinha ido fazer uma viagem, juntamente com a sua alegria e felicidade. Ficou, portanto, só, triste e infeliz.
Nesse ano, não teve vontade de decorar a árvore de Natal, nem de comprar bolas novas, para a enfeitar. Não andou pelas ruas iluminadas, fazendo planos para quem iria distribuir as prendas, nem comprando coisas lindas para oferecer aos que lhe eram queridos. Não fez cartões de Boas Festas, nem lhe apeteceu enviar alguns já feitos. Pior ainda, não sentiu amor, tolerância, espírito de dádiva, paz, compaixão.
Sem espírito de Natal, sentia-se vazia e solitária.
Que fazer?
Resolveu esperar por ele. Será que iria demorar-se? Por onde andaria ele nesta altura? Ainda estaria a viajar com a sua alegria e felicidade? Por que teria ido embora?
Enquanto esperava, resolveu encher o seu vazio, construindo uma casa nova para o seu espírito de Natal. Edificou tudo num instante.
A casa de tijolo tinha paredes brancas, rasgadas por janelas enormes. A porta estava entreaberta para que o espírito de Natal, a sua alegria e felicidade entrassem, logo que chegassem. O telhado tinha uma chaminé catita, com uma abertura larga e escadinhas que davam entrada directa para a lareira. É que nunca se sabe... O espírito de Natal podia armar-se em Pai Natal, querer entrar pela chaminé e depois, se fosse demasiadamente estreita, ficaria lá entalado!
De fora, espreitava-se pela janela e viam-se cortinas salpicadas de flores e plantas que sorriam encantadas para um raio de sol, que as tinha ido visitar.
No hall, havia um móvel rústico, onde se penduravam os casacos e os chapéus e, em baixo, estavam guarda-chuvas. Só para o caso da chuva se atrever a molhar este quadro idílico...
À direita, entrava-se para a sala de estar. Como o nome indica, dava vontade de se estar lá. Os sofás confortáveis convidavam ao descanso e ao relaxamento. Da aparelhagem, saíam notas musicais que dançavam juntamente com sons da natureza.
A menina estava lá de olhos fechados. Aquela música fazia recordar-lhe a sua infância, momentos felizes que guardava na sua memória, como se fossem segredos só dela, fechados a sete chaves na escrivaninha da sua lembrança.
Esse compact-disc que tocava, tinha música calma onde se misturavam sons naturais, como o barulho do mar com os seus golfinhos, o vento nas árvores, o canto dos pássaros e, ainda, ralos e grilos.
Alguns desses acordes de mar, faziam-na pensar no seu primeiro namorado, quando, ao domingo à tarde, iam passear pela Foz de mãos dadas, exibindo o que eles julgavam ser as suas melhores roupas.
Perduram ainda hoje, a suavidade desses momentos, as palavras que se sentiam no silêncio.
O barulho dos ralos e dos grilos era-lhe particularmente agradável.
Transportavam-na imediatamente para as noites do verão de 79, em que fez campismo selvagem com os pais. De dia, andava com um grupo de pré-adolescentes que se tinham tornado amigos inseparáveis. De noite, quando o calor acariciava seus sentidos, davam longos passeios pelas ruas aprazíveis da Granja, bordadas de lindas casas. Colhiam-se flores pelo caminho, apreciava-se o aroma da noite e o som repetitivo e securizante dos ralos embalava-lhes os passos.
O barulho do vento nas árvores, fazia lembrar fins de semana no Gerês, piqueniques na Quinta da Conceição, e mais recentemente, tardes amenas no Parque da Cidade.
Quando o bebé receava o vento nas árvores, a menina, dizia-lhe com um ar entendido, que o vento era atrevido, que fazia cócegas às folhas e o barulho que se ouvia, eram as folhas a rir. Então, o bebé mais seguro de si, sorria, contemplava as folhas com outro olhar e ficava a gostar um pouco mais do vento.
Em frente, um corredor dava para quatro portas. A primeira, era a do escritório. Era o lugar onde a menina se queria inspirar para escrever um conto dedicado ao seu espírito de Natal. As paredes estavam cobertas de estantes e, estas, estavam a abarrotar de livros e de molduras com fotografias.
Em frente à janela, havia a escrivaninha de estilo romântico, onde a menina se sentava a escrever poesias ao seu espírito de Natal em papéis de carta coloridos e perfumados.
Às vezes, também lhe escrevia mensagens que mandava via internet. Sim, porque hoje em dia, até os contos de Natal e as suas personagens têm que se adaptar à modernidade e às suas novas tecnologias.
As outras portas davam para os quartos: um para o espírito de Natal, outro para a sua alegria e felicidade que bem podiam dormir juntas na mesma cama e o último era da menina.
O seu quarto era simples, mas acolhedor. Os móveis sóbrios, em madeira, davam um ar quente e a colcha de patchwork colorida tinha sido feita por ela. Cada quadrado representava um momento significativo da vida dela. Não eram só alegrias e felicidades. Também estavam lá costuradas as decepções, as tristezas e as solidões.
Quando acabou a decoração e sentiu que estava em casa, o milagre aconteceu. Já era Dezembro do ano seguinte.
Num canto da sala, a árvore de Natal estava enfeitada alegremente de fitas, bonecos, bolas e luzes. Numa mesinha, ao lado, o Menino Jesus estava deitado nas palhinhas, aquecido pelo ar quente da vaquinha, no seu lindo presépio.
Em cima da mesa da sala, os cartões estavam prontos para serem enviados. Da cozinha, vinha um cheirinho a doce: pão-de-ló, bolo-rei, aletria, frutos secos, arroz-doce, rabanadas e outras delícias que abriam a nossa imaginação...
As prendas estavam embrulhadas em papéis brilhantes, etiquetadas para os respectivos donos.
A prenda maior que lá estava, era uma caixa florida, com a tampa semi-aberta.
A menina movida pela curiosidade, foi espreitar...
Não ficou muito surpreendida quando, de lá, viu sair o seu espírito de Natal, juntamente com a sua alegria e felicidade, mais gordinhas.
Foi a menina que, à medida que ia preenchendo o seu vazio, puxava de volta o que lhe faltava. É que, apesar da tristeza e da solidão, nunca deixou de ter Esperança.
E a Esperança é o berço do espírito de Natal, da alegria e da felicidade...

Jacqueline Lima

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