sinopse: "Em todos os dias do ano, ao longo dos tempos, aconteceram imensas, imensas coisas. Algumas modificaram o mundo, outras fazem parte da história, da religião, da tradição".
O Livro das Datas assinala a centésima publicação da escritora Luísa Ducla Soares.
Esta obra, como o próprio nome indica, narra pequenas histórias sobre as datas relevantes que decorrem ao longo do ano, explicando o seu significado e a sua origem. O 25 de Abril, o 5 de Outubro, o Dia das Bruxas ou o Dia do Pai são apenas alguns dos exemplos a destacar.
No fim do livro, os leitores têm um espaço próprio para mencionar as datas que, para si, são as mais importantes.
No reino da bicharada
Aquele leão era mesmo
convencido.
- Sou o rei dos
animais – rugia, sentado no rochedo que lhe servia de trono. E os bichos
encolhiam-se porque ele é que mandava naquelas terras como antes tinham mandado
o seu pai e o seu avô. O galo deixara de cantar para não o acordar de
manhã. A hiena tivera de se tornar vegetariana para o grande senhor dispor de
toda a caça. Até o elefante deixara de tomar duche na lagoa, não fosse turvar a
água onde o leão se via ao espelho. Já estavam habituados àquela vida. Triste
sorte, triste sorte...Só o pardal não se conformava. De vez em quando batia asas e voava para outras paragens onde os animais eram livres e felizes. Quando voltava, punha-se a perguntar, do alto de uma árvore:
- Porque é que vocês fazem tudo o que manda este leão?
Os bichos abafavam-lhe o pio, cantando em coro:
E o nosso rei,
Ele é que manda
E faz a lei.
Sempre assim foi,
Assim será,
E nada muda
Nem mudará.
- Mas por que razão é rei?
Ninguém sabia responder.
- O leão é o bicho mais velho? – quis saber o pardal.
- Não, eu é que sou a mais velha – confessou desta vez a tartaruga que, nunca gostava de dizer a idade.
- É o que tem a boca maior?
Imediatamente o crocodilo e o hipopótamo escancararam as bocarras.
Pela primeira vez, os bichos começaram a pensar que talvez fosse melhor o leão ser substituído.
-Ele só sabe resolver tudo à dentada – criticou uma zebra.
A águia-real aproveitou para propor:
- Eu substituo bem o leão. Não tenho dentes, podem ter a certeza de que não lhes mordo. Como voo alto posso controlar tudo lá de cima. Os bichos é que não estiveram pelos ajustes:
- Ora, ora, tu resolvias tudo à bicada – exclamou logo o pardal.
- Estamos fartos! Não queremos mais reis!
O leão, furioso, ainda tentou travar a revolução. Mas, quando se preparava para morder, um enxame de abelhas pregou-lhe mil ferroadas na língua. Fugiu dali a sete pés...
Então a bicharada reuniu-se toda à beira da lagoa e proclamou a república. A eleição vai ser amanhã e ninguém vai faltar ao acto eleitoral pois o papagaio não se cansa de repetir:
Não
somos gente
Mas
também queremos
Um
presidente.
Na
nossa terra
Quem
mandará?
Todos
aqueles
Que
vivem cá.
Sejam
do ar,
Venham
já todos,
Vamos
votar!
Luísa Ducla Soares
O Livro das Datas